domingo, 26 de maio de 2013

A Família de Jó
Estabelecendo Prioridades


Um filósofo, dando aulas para seus discípulos, resolveu ensiná-los uma grande lição. Ele elaborou o seguinte raciocínio: pegou quatro vasos pequenos contendo, respectivamente pedras grandes, pedregulho, areia e água. Depois foi despejando, na mesma sequência acima, todos os elementos em um vaso grande. Os alunos logo entenderam que a sequência tinha que ser partindo da pedra grande, passando pela pedra pequena, areia e, finalmente a água. Se começasse pela água, sobraria material para encher o vaso grande.
O que o filósofo queria ensinar era que seus alunos deveriam colocar o mais importante em primeiro lugar; o resto serviria para preenchimento.
Esta é uma lição que todos nós devemos aprender. Infelizmente, alguns estabelecem as prioridades erradas e vão deixando o essencial para depois e depois e, quando percebem, já não tem mais tempo para o que deveria estar em primeiro lugar.
Quando falamos sobre a vida familiar, a preocupação com as prioridades certas deve ser mais acentuada ainda. A seguir vamos pensar um pouco mais sobre as verdadeiras prioridades e como elas devem ser aplicadas em nossa vida. Vamos retirar esses ensinamentos da vida e família de Jó.
Na introdução do livro de Jó encontramos as seguintes palavras: “Havia um homem na terra de Uz, cujo nome era Jó; e era este homem íntegro, reto e temente a Deus e desviava-se do mal” (Jó 1:1).

O livro de Jó

Jó se tornou muito famoso devido à sua resistência ao sofrimento e sua fé diante de problemas gigantescos. Mas estas não são as primeiras mensagens do livro. Embora deva admitir que a maior parte do livro refere-se ao sofrimento, existe outra mensagem no livro que é anterior a esta.
Possivelmente, Jó foi contemporâneo de Moisés[1]. Aliás, algumas pessoas não sabem, mas o livro de Jó foi escrito por Moisés durante os 40 anos que ele viveu no deserto de Midiã, naquele período em que Deus estava fazendo Moisés perder a autossuficiência adquirida no Egito e ganhar a dependência de Deus tão necessária para a sua missão.
O livro de Jó, portanto, foi o primeiro livro da Bíblia a ser escrito. A Bíblia diz que a história se passa na Terra de Uz. O primeiro livro da Bíblia não tem seu cenário num contexto israelita. Possivelmente, Uz ficava perto do rio Eufrates. Um ambiente cercado de paganismo e com muita propensão ao esquecimento do Deus verdadeiro.
Neste ambiente se desenvolve a história de um dos homens mais fiéis que a terra já conheceu. Isso nos ensina que não importa o ambiente em que nos encontramos, o que importa é a decisão de servir verdadeiramente a Deus. É nesse ambiente hostil à religião verdadeira que nasce uma família fiel a Deus.
O primeiro livro escrito da Bíblia tem um contexto familiar. Acho lindo pensar que a primeira mensagem escrita de Deus à humanidade foi a de uma família fiel e feliz. Antes mesmo de apresentar o Grande Conflito ou a fidelidade de Jó, Deus resolveu nos mostrar uma família que O honrava. Deus tem como prioridade a família e isso ficou bem claro com o tema que Ele escolheu para começar seus escritos sagrados.

O Retrato da Família de Jó

         Jó, o patriarca.

            Gostaria de apresentar a você os membros da primeira família descrita da Bíblia. Vamos começar pelo patriarca, Jó. A Bíblia o descreve com alguém íntegro, reto, temente a Deus e que se desviava do mal. Estas características são bastante significativas e vale a pena pararmos um pouco nelas.
Ser integro do ponto de vista bíblico não indica ausência de pecados. A palavra “Íntegro” é a tradução da palavra hebraica “Tam” e da palavra  Grega “Teleios”. Outras traduções possíveis e até mais esclarecedoras são: Maduro ou plenamente desenvolvido. Então, quando a Bíblia diz que Jó era íntegro, não estava falando de impecabilidade, mas estava descrevendo alguém que não parava de crescer espiritualmente. Alguém que estava espiritualmente maduro dentro de sua fase.
A integridade bíblica se dá de maneiras diferentes entre as crianças, jovens e adultos e entre os cristãos de berço e os cristãos mais recentes na fé. É por isso que não podemos ficar comparando as pessoas na igreja, porque cada uma está num estágio da carreira cristã e seu objetivo deve ser estar plenamente desenvolvido para aquele estágio.
O problema é que muitos cristãos estão atrofiados espiritualmente. Estagnados na vida cristã. Há muito tempo não progridem no conhecimento da palavra de Deus, no relacionamento com Cristo e, por isso, estão atrofiados espiritualmente. Para Deus o íntegro é aquele que não para de crescer.
Outra característica de Jó é a sua retidão. Essa é uma faceta daqueles que seguem fielmente a Jesus, caminham sempre pelo caminho de Deus que é reto em direção ao céu. “Reto” é uma descrição moral dele, ele era coreto em seus negócios, honesto com seus funcionários.
Jó também era temente a Deus. Esta é uma expressão que denota alguém leal e devoto, que ama a Deus profundamente.
Finalmente Jó é descrito como alguém que se desvia do mal. Perceba que essa é uma característica que indica que Jó estava decidido a se afastar de tudo que era ruim. As outras três características se referem a coisas abstratas, mas esta última é bem concreta. Jó, conhecendo suas inclinações, estava decidido a passar bem longe do mal. Esse é um exemplo a ser seguido. Alguns cristãos gostam de viver perigosamente e arriscam-se ficando perto de suas tentações. Muitas vezes são jovens que arriscam sua pureza namorando em lugares isolados, outras vezes são pessoas casadas que entram em conversas muito íntimas com alguém que não é seu cônjuge ou homens de negócio que arriscam sua integridade moral em negócios duvidosos. O conselho bíblico é: ande o mais distante possível do mal.

As Riquezas

            Jó 1:3 nos diz assim: “E o seu gado era de sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas de bois e quinhentas jumentas; eram também muitíssimos os servos a seu serviço, de maneira que este homem era maior do que todos os do oriente” (Jó 1:3).
            Ele era um homem muito rico. Tinha os bens mais valorizados de sua época.  Ovelhas, Camelos, Jumentas e servos. Os camelos de forma especial nos indicam que ele fazia transações comerciais à longa distância. Era para isso que os camelos eram usados. Jó era como um dono de uma multinacional. A Bíblia chega a dizer que ele era o mais rico do oriente. Também podemos inferir que ele era um pai de família trabalhador, pois, sem dúvida, foi com trabalho honesto e diligente que ele construiu tudo o que tinha.
            Precisamos observar, no entanto, que toda a prosperidade e todo o trabalho não impediam que ele fosse um homem consagrado e que cuidava bem de sua família. Infelizmente, hoje vemos muitos pais que têm carros do ano, que possuem as melhores roupas, que dão para os filhos os presentes mais caros, porém, pecam em cuidar da família. Pensam que dando dinheiro para os filhos poderão substituir a presença deles, mas a vida tem mostrado que um dia esses pais colherão consequências assustadoras na vida dos seus filhos.
            Há alguns anos fui pregar durante uma semana em uma igreja de uma capital do Nordeste brasileiro. Fiquei hospedado na casa de uma família que me acolheu muito carinhosamente. Naquela semana pude ver o exemplo de uma família que desfrutava de uma excelente condição financeira, mas não deixava com que isso afetasse a educação dos filhos e o relacionamento entre o casal.
            Poucas vezes encontrei crianças tão educadas e tão cristãs quanto o casal de filhos daqueles irmãos. O carinho entre os pais também era algo notório. Ali vi um bom exemplo de uma família que não deixava com que o dinheiro e o trabalho se sobrepusessem às coisas essenciais da família: Deus e o amor mútuo.
           
A esposa de Jó

            Temos poucas informações sobre a esposa de Jó. No livro inteiro só encontramos um versículo que fala de forma mais direta dela: “Então sua mulher lhe disse: Ainda reténs a tua sinceridade? Amaldiçoa a Deus, e morre” (Jó 2:9). Se lermos apenas estas palavras e não pararmos para refletir, corremos o risco de condenar a esposa de Jó de maneira injusta.
            O Targum, livro de tradições judaicas, diz que o nome dela era Diná e que seria uma das filhas de Jacó. Nesse caso, Jó seria genro de Jacó. Mas tudo isso é o que fala a tradição, não temos como comprovar.
A LXX apresenta um suposto discurso ampliado da esposa de Jó: “E depois de ter passado muito tempo, sua mulher lhe disse: Quanto tempo ainda irás aguardar, dizendo: ´Eis que esperarei um pouco mais, aguardando a esperança do meu livramento?´ Pois eis que foi abolido da Terra o teu memorial: os teus filhos e filhas, as angústias e dores do meu ventre, que, com sofrimento, dei à luz em vão; e tu mesmo te assentas para passares as  noites ao relento, em meio à corrupção dos vermes, e eu sou uma peregrina e uma serva que vai de lugar em lugar e de casa em casa, esperando o sol se pôr para eu possa descansar de meus  labores e das dores que agora me perseguem: mas diz alguma palavra contra o Senhor e morre[2]”.  Este é um trecho que carece de mais fontes para ser confirmado como verdadeiro, mas ele nos ajuda a imaginar o que a esposa de Jó passou.
Trabalho em Escolas há dez anos e já me deparei com histórias de algumas mães que perderam seus filhos. Uma dessas aconteceu numa escola no sul do Brasil. Um jovem do Ensino Médio que não apresentava doença alguma morreu subitamente logo depois de ter retornado da escola. Os exames póstumos não conseguiram apresentar as causas da morte. Foi uma tristeza para a escola e uma tragédia para a família. A mãe daquele menino ficou de tal forma abalada que precisou ser medicada e depois de muitos dias da morte ainda sofria muito. Uma mãe nunca deixa de sofrer pela morte de um filho, mesmo que passem muitos anos.
A morte de um filho já destrói uma mãe, agora avalie o que significa perder dez filhos de uma vez. Certamente a esposa de Jó estava em um estado de sofrimento fora do imaginável. Assim conseguimos dar um desconto para as palavras que ela falou ao seu marido. Não podemos esquecer que uma família bem estruturada certamente tem a participação da mãe e a família de Jó era assim. Podemos ter certeza que ela era uma boa mãe.

Os Filhos

Outra evidência de que a família da Jó era um exemplo de uma família feliz são os seus filhos. A Bíblia os descreve assim: “E nasceram-lhe sete filhos e três filhas. (...) E iam seus filhos à casa uns dos outros e faziam banquetes cada um por sua vez; e mandavam convidar as suas três irmãs a comerem e beberem com eles” (Jó 1: 2,4).
Observe que os banquetes nas casas uns dos outros eram frequentes e a expressão “cada um por sua vez” nos indica, possivelmente, o aniversário da cada um, quando se reuniam para festejar. Sem dúvida eram filhos unidos e que gostavam de estar juntos.

O segredo da família de Jó

            Temos na família de Jó um exemplo a ser seguido e eu creio que foi por isso que Deus começou a produção das escrituras sagradas com este exemplo. Para que as famílias do Seu povo pudessem imitar esta família.
            Vale a pena, então, nos aprofundarmos um pouco mais na família de Jó e descobrirmos qual o segredo para tanta felicidade, fidelidade e união.
            As Escrituras Sagradas nos indicam esse segredo: “Sucedia, pois, que, decorrido o turno de dias de seus banquetes, chamava Jó, e os santificava, e se levantava de madrugada, e oferecia holocaustos segundo o número de todos eles; porque dizia Jó: Talvez pecaram meus filhos, e amaldiçoaram a Deus no seu coração. Assim fazia Jó continuamente” (Jó 1:5).
            Jó chamava seus filhos e os santificava. Esse era o trabalho de um pai que entendia que era o sacerdote da família. Ele compreendia que a responsabilidade espiritual de todos passava por ele. É verdade que depois que os filhos crescem cada um tem liberdade de decidir o que fará de sua vida e os pais não podem ser responsabilizados por isso. Mesmo assim os pais precisam continuar intercedendo pelos filhos. Era isso que Jó fazia. Ele chamava os filhos em casa periodicamente e os filhos iam. Ainda existia respeito dos filhos para com os pais mesmo depois de crescidos.
É possível que Jó intercedia  pelos filhos para que eles não fossem tentados pelo conforto no qual viviam. Essa oração deveria ser feita por cada pai do mundo atual. Deveriam ensinar seus filhos a darem mais valor ao que é divino e pedir a Deus que os conserve assim.
Tudo o que o patriarca fazia em relação aos seus filhos era um reflexo de sua própria vida espiritual. A Bíblia diz que ele se levantava de madrugada para orar por sua família. Jó tinha muita gente por quem orar e por isso precisava de bastante tempo tranquilo.
Hoje vivemos em um período de muita correria. As pessoas acordam cedo e dormem tarde correndo atrás de acumular bens. Mas o hábito de acordar mais cedo para orar deve ser algo cultivado. Não é algo fácil e natural. Precisamos nos condicionar a isso, mas tenha certeza de que uma hora a menos de sono não vai te matar, mas uma hora a mais de consagração pode te manter vivo espiritualmente.
Era assim a vida de Jó. Ele intercedia pelos filhos e o fazia continuamente. Que impressionante! Embora rico, influente e cheio de reponsabilidades não deixava de buscar a Deus. Nada o impedia de cuidar dos filhos física e espiritualmente. Certamente ele não era menos ocupado que muitos pais de hoje, mas tinha bem fixo diante de seus olhos qual era a prioridade de sua família.

Espiritualidade: base de uma família feliz

Cada casa deveria ser uma pequena igreja. Falo isso no sentido de que cada casa deveria ter a presença constante de Deus e ter um clima constante de felicidade no Senhor. Mas isso só é possível quando Deus é colocado como prioridade. Não há problema em trabalhar, acumular bens, ter uma vida confortável. O problema começa quando essas coisas são as nossas prioridades em detrimento da vida espiritual.
É preciso investir tempo na espiritualização do lar: “Em muitos lares a oração é negligenciada. Os pais entendem que não possuem tempo para o culto da manhã e da noite. Não podem economizar alguns momentos para serem dispendidos em ações de graças a Deus pelas Suas abundantes misericórdias - pela bendita luz do Sol e pela chuva, as quais fazem com que a vegetação floresça, e pela guarda dos santos anjos. Não têm tempo para fazerem oração pedindo auxílio e guia divinos, e rogando a contínua presença de Jesus na casa. Saem para o trabalho como o boi ou o cavalo, sem um pensamento de Deus ou do Céu. Têm almas tão preciosas que, em vez de consentir o Filho do homem ficassem elas perdidas, deu Ele a vida para resgatá-las; eles, porém, têm pouco mais apreciação de Sua grande bondade do que a têm os animais que perecem[3]”.
O salmista Davi já falava há muito tempo sobre a única forma de manter uma vida feliz e, consequentemente, um lar feliz. “Com que purificará o jovem o seu caminho? Observando-o conforme a tua palavra. Com todo o meu coração te busquei; não me deixes desviar dos teus mandamentos. Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti” (Salmos 119:9-11). Sem religião todos ficarão sem rumo.
Deus se sente feliz em estar numa casa onde Ele é prioridade. “Semelhantes aos patriarcas da antiguidade, os que professam amar a Deus devem construir um altar ao Senhor onde quer que armem sua tenda. Se houve um tempo em que cada casa deve ser uma casa de oração, é hoje. Pais e mães devem muitas vezes erguer o coração a Deus em humilde súplica por si e por seus filhos. Que o pai, como o sacerdote da casa, deponha sobre o altar de Deus o sacrifício da manhã e da tarde, enquanto a esposa e filhos se unem em oração e louvor. Em uma casa tal, Jesus gostará de demorar-Se[4]”.
Imagine o privilégio de morar numa casa onde o próprio Cristo tem prazer em ficar. Hoje Deus te convida a seguir o exemplo de Jó, dando prioridade à religião em seu lar, não permitindo que o trabalho atrapalhe a comunhão da família. Entregue sua família nas mãos de Deus e permita que ele faça dela uma família feliz.








[1] Comentário Bíblico Adventista, v.3, 549
[2] Comentário Bíblico Adventista, v.3,  561
[3] Ellen White. Patriarcas e Profetas, 144. 
[4] Ellen White. Patriarcas e Profetas, 144  

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